PÔQUER A SEIS
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Orelha do livro “Pôquer a seis”, publicado pelo pessoal do Hupokhondría.
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Escrever é como jogar cartas. As palavras chegam embaralhadas. Nem sempre é possível fazer boas combinações. Muda-se o jogo, mudam-se os valores. Às vezes, a sorte comanda. De vez em quando, o blefe vence. A jogada de mestre não é apenas inspiração. Os curingas enganam. As regras, quase sempre, funcionam. As apostas interrogam a diversão, mas as belezas e os caprichos amenizam as perdas. Importante: para que as cartas brinquem com você, é necessário convidar outros jogadores.
Pôquer a seis é um jogo. De um autor a outro, as narrativas vão se compondo com o baralho mais fino e mais grotesco: a psique humana. Na brincadeira, valem as cartas que cada um tem na mão, sejam palavras, sejam ideias. Porém, o que dita possíveis destinos é o que cada jogador descarta. Entre a mão e a mesa, misturam-se os autores, os narradores, as vozes, as personagens.
Uma mulher, um homem, o self, a Táscia, uma intuição, o animus, a anima, a Raíssa, o Jung, ele, a Elena, outra mulher, outra alma, o ego, a Louise, a persona, o Gustavo, aquele homem, ela, a Mariana, a sombra, alguém.
Eis que mais uma cadeira é colocada diante do pano verde, sob a luminária central. Com a respiração expectativa, no lugar outrora vazio – perenemente vazio –, assenta-se você. Agora a mesa está quase completa, os jogadores estão quase preparados: é hora de começar. O leitor, figura mais aguardada e mais inusitada, é celebrado e temido. Neste exato momento, recebe também sua quota de palavras, afetos e insabidos.
Ler é como jogar cartas. A experiência convoca perdas e ganhos. A distração tanto ajuda como atrapalha. O mistério está dividido entre os jogadores e pode nunca ser revelado (e essa é uma boa rodada!). O silêncio vale ouro; os dizeres são suspeitos e, por isso, seduzem. O que as normas proíbem acaba vazando pelos olhos, nas expressões, nos movimentos. Não há como voltar atrás, as emoções são vividas apenas uma vez: aquela.
Aqui: pode viciar, pode libertar. Pode matar ou remir o tempo. Pode abrir ou fechar os caminhos. Você pode se encontrar e se perder – ao mesmo tempo. Você é o curinga.
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